Governo precisa de mais fundos para obter votos e quem vai pagar é o país, com menos crescimento e mais dívida
Arthur Lira (PP-AL) colocou uma faca no pescoço de estados e municípios com o objetivo de baixar impostos sobre combustíveis e talvez sobre energia elétrica, comunicações e transportes. Ameaça também um calote nas distribuidoras de eletricidade (as que vendem a energia para o consumidor).
Lira quer baixar a inflação na marra e a curto prazo a fim de melhorar as chances eleitorais de Jair Bolsonaro e turma. Outras promessas do governismo, como o reajuste da tabela do Imposto de Renda, reafirmada ainda em abril, foram para o vinagre, assim como a ideia de subsidiar diesel e gasolina, cara e inviável, mas ineficaz.
O governo precisa, pois, com urgência, de mais fundos para obter votos.
As ameaças de Lira custariam dezenas de bilhões, teriam efeito de curto prazo na inflação, dariam algum dinheiro para consumidores e deixariam mais problemas econômicos para o próximo governo.
É incerto que tais projetos passem. Mas a chantagem está na mesa.
O projeto que reduz alíquotas de ICMS tiraria R$ 65,7 bilhões de estados e municípios, em um ano, no cálculo da Confederação Nacional dos Municípios (a conta dos governos estaduais, perda de até R$ 100 bilhões, é exagero). Nem devem perder tudo isso também porque, com menos imposto, vai haver algum consumo extra (e recuperação de parte da receita).
Para tentar driblar a alta dos combustíveis, o governo Jair Bolsonaro (PL) começou a preparar uma PEC (proposta de emenda à Constituição) pa Lucio Tavora/Xinhua
Nos 12 meses até março, estados e municípios tiveram superávit primário (receita maior que despesa) de R$ 130 bilhões (ou R$ 123,3 bilhões, sem correção pela inflação). Equivale ao superávit inteiro do setor público (governo federal, que tem déficit, estatais e governos regionais).
Mas o superávit de estados e municípios tende a cair (está no maior nível em 20 anos), até porque vão perder receita devido a reduções de impostos federais (aos quais, em parte, têm direito). Além do mais, já aumentam gastos, e a arrecadação não vai mais crescer como nesta temporada de inflação e commodities em alta.
Sim, caso o corte de impostos chegasse inteiro ao consumidor, a inflação cairia de modo relevante, a curto prazo (um ponto percentual, por aí). O déficit público aumentaria, da pior maneira: mais dívida, mais juros.
Se passar a suspensão do reajuste das distribuidoras, haverá confusão jurídica, econômica e apenas adiamento do aumento —até gente de Bolsonaro acha essa ideia demente.
Se estados diminuírem suas alíquotas únicas do diesel (Bolsonaro foi ao STF para tanto), a redução de preço será mínima.
É possível mexer em impostos, ter política de energia e o diabo. Mas o que se faz agora é improviso imediatista eleitoreiro. As consequências ruins começam a aparecer logo no ano que vem.
No fim das contas, quem vai pagar esse estelionato eleitoral é o país, com menos crescimento e mais dívida. O povaréu em particular.
Fonte: folha.uol.com.br